Pedro Hewitt: Já temos uma boa data de parceria e amizade, Ahnysha, sempre é um prazer dar o suporte necessário para seus projetos. Como vai?
Ahnysha: É sempre um prazer
imensurável pra mim trocar ideia contigo e sou imensamente grata por todo
suporte que recebo de ti! Como sempre, sigo indignada, estressada e com fome (Risos)
Pedro Hewitt: Ser frontgirl de projetos
pesados não deve ser fácil, ainda por serem um tanto distintos de gêneros. Como
faz para conciliar ambos e se concentrar de maneira igual em cada?
Ahnysha: Realmente é um pouco
complicado, ainda mais por não ser sortuda e conseguir viver do que eu gosto de
fazer. A SavageZ exige mais do meu tempo, com ensaios e afins, já a Fatal é bem
mais flexível, já que a gente decidiu fugir um pouco desse padrão de dor de
cabeça com banda, a gente ensaia e se encontra quando dá, é bem raro até, mas
quando rola, sai de baixo. Isso me permite conseguir estar nas duas sem
prejudicar nenhuma delas.
Pedro Hewitt: E sua vida pessoal parece bem
corrida, ter esses ‘corres’ não atrapalha de uma certa forma?
Ahnysha: Eu gostaria de fugir um
pouco do chicote da escravidão, mas eu preciso pagar as contas. O trabalho toma
conta de grande parte do meu tempo, isso afeta diretamente as bandas: ensaios
tarde da noite não são produtivos por conta do cansaço, temos de ficar adiando
coisas que a gente precisa fazer como gravações por exemplo, dentre outras
coisas. Mas isso é o tempero para tocar com mais ódio.
Pedro Hewitt: Pra ser uma frontgirl tem que
saber cantar bem, entender a música ou você observa de uma maneira mais
específica?
Ahnysha: Acima de tudo, o que
vale para mim é como tu te porta fora do palco, qualquer um pode subir ali,
fazer um show e um discurso pica, todos vão te aplaudir, mas e depois? Será que
você é tudo isso fora dele? Será que quando tu tá no meio de uma situação de
injustiça, covardia, homofobia, racismo, xenofobia e toda essa desgraça, tu
fica calada? Finge que não tá vendo? Ou tu te mete e defende, indo pra cima
caso necessário? Por último, voltando pro tema música, tu só precisa fazer tua
parada, tem que ser bom pra ti, o resto, o velho foda-se.
Pedro Hewitt: Com toda ousadia e forma
brutal em cima de palco, infelizmente há aqueles comentários chatos e
inconvenientes que envolvem assédios, cantadas sem graça e até mesmo
comentários maldosos, não é verdade? Isso acontece com uma certa frequência com
você? Se sim, como lida com isso?
Ahnysha: No começo ouvia vários
comentários, mas somente sobre meu vocal e performance e de como eram deploráveis.
Com o passar do tempo, fui melhorando, daí começaram a surgir os comentários,
de que eu só estava em banda para chamar atenção de macho, que eu não gostava
daquilo de fato, era só visual e blá blá blá. Mais pra frente surgiram os
comentários sobre a forma que eu me visto, já que eu cantava em banda de metal,
deveria me vestir de forma mais respeitosa, nego implicava até com as fotos que
eu postava. Com o tempo comecei a me posicionar, a questionar, desde então,
nunca mais ouvi um comentário desses. Se rola, deve ser pelas costas, mas a
verdade é que eu não tô nem aí pra essa escória, é só um bando de gente frustrada
procurando algo pra falar mal. Já rolou assédio também e o mais triste é que as
vezes só a presença de algum dos meninos da banda resolvia a situação. De um
tempo pra cá, ouço mais críticas construtivas e elogios. Fico no aguardo das
situações chatas, só que mais preparada.
Pedro Hewitt: Com a situação atual do país,
as mulheres parecem que tornaram alvo fácil para uma cambada de soldadinhos de
políticos perderem o medo e soltarem suas vozes inúteis, querendo bancar os
superiores. Quebrando os padrões que a sociedade impõe, você, tatuada,
vocalista de bandas, com alguns piercings, com cabelo pintado, isso resulta em
algum preconceito por onde anda, por onde toca ou pelas redes sociais?
Infelizmente o machismo a cada dia que passa aparece de uma forma que não dá
para perceber.
Ahnysha: Infelizmente, sim.
Olhares tortos por todo lado, gente que te ignora, que não te leva a sério,
gente que te trata como se fosse uma aberração, por rede social então é que a
galera mostra as "asinhas". Mas o tempo que eu me importava com isso
já passou, estou aqui pra incomodar, mostrar quem sou e se estou incomodando,
estou no caminho certo.
Pedro Hewitt: Como você avalia as mudanças
no cenário DIY feminino de uns anos pra cá?
Ahnysha: Me orgulho em dizer que
nós, mulheres, estamos perdendo o receio e até o "medo" de botar a
cara pra fazer qualquer coisa que nos dê vontade, e isso vale pra tudo. A
galera tá ficando mais cabeça aberta, curtindo de verdade, apoiando, sem aquela
velha segunda intenção. Até mesmo entre as mulheres (esse ponto é bem delicado -risos-),
estão deixando intriguinhas imbecis de lado, se unindo por uma causa maior,
exigindo mais bandas com mulheres nos eventos, na organização. Isso reflete no
público, as mulheres se sentem mais representadas, mais confortáveis.
Pedro Hewitt: Nesse cenário podemos citar
bandas como Melyra, Charlotte Matou um Cara, A Mentira Oculta, Balanopostite,
enfim. Com total humildade, quais os tipos de bandas na atualidade que merecem
ser entendidas como Undergrounds e “médias”, e aquelas que, na sua opinião,
claro, não mereciam ser?
Ahnysha: Pergunta complicada essa.
As bandas que fazem a parada acontecer e dão suporte, que não ficam esperando
cair do céu, tudo mastigadinho, dão o sangue e claro, não vem com qualquer
discursinho torto, que realmente são contra todos esses absurdos atuais,
merecem sim serem entendidas como underground. As que não, você percebe a
partir do momento em que começam a se vender, com atitudes extremamente
pensadas apenas no dinheiro e em quanto ibope receberão. Aí você sabe que tá na
hora de pegar a trouxinha e dar o fora desse meio, ainda mais se tiver algum
membro no meio que apoie qualquer tipo de barbárie.
Pedro Hewitt: Qual o significado de música e
ideologia pra você?
Ahnysha: A música pra mim sempre
será minha válvula de escape de toda essa merda que rola desde sempre, uma
forma poética de se expressar e impor diante de toda essa falácia, ainda mais
quando podemos associar a um ideal digno, correto e justo. Claro que nem sempre
isso acontece, infelizmente ainda tem gente que dá voz, ouvido e suporte pra
banda e pessoas com ideias babacas. É lamentável, mas o círculo tá se fechando
cada vez mais e gente ignorante e os que se fazem, cairão.
Pedro Hewitt: Que as cordas vocais nunca se
esgotem e que a força da mulher a cada dia esteja intensa diante não só a
música. Agradeço de coração o tempo que disponibilizou para esta entrevista.
Até breve!
Ahnysha: Eu me sinto sempre
lisonjeada em responder tuas perguntas! Paz entre nós, guerra aos senhores! Até
a próxima!
Para conhecer mais sobre Ahnysha:
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