A banda Vazio conversou com o nosso redator Pedro Hewitt e compartilhou com a gente muito de sua filosofia e traz detalhes sobre o Eterno Aeon Obscuro, seu último álbum lançado e 2020. Renato Gimenez fala a respeito do álbum e também sobre política e muito mais. Confiram.
Pedro
Hewitt - O Vazio iniciou seus trabalhos em 2016 com vários integrantes
oriundos de importantes bandas do cenário nacional que acompanho a anos.
Como foi o nascimento do projeto e a escolha pelo Blackened Crust?
Renato
Gimenez: Primeiramente obrigado pelo espaço e pelo interesse na obra do
Vazio. Fundamos a banda em 2016 eu e o Daniel Vecchi, quando ainda
fazíamos parte do Social Chaos. A nossa idéia era tocar metal ainda mais
extremo com temática ocultista aprofundado em experiências e
conhecimentos na via sinistra. Sobre o “Blackened Crust”, eu curto
algumas bandas dessa pegada, mas não acredito que o termo se aplique a
música do Vazio, mas esta é apenas a minha opinião. O punk está nas
nossas vidas, nas atitudes diárias, no espírito de rebelião social, como
combatemos esse sistema de merda e sobrevivemos a esse país. Já o Vazio
é uma banda de Black Metal, hoje formada por membros e ex-membros de
bandas como Armagedom, Creptum, Nuclear Frost entre outras muitas bandas
que fizemos parte.
Pedro
Hewitt - Enquanto o podre e sujo cristianismo veem um estado de vazio
como uma condição indesejada e negativa, em algumas filosofias é visto
como uma natureza sem distinções e dualidades, que vê através da ilusão
independente da própria natureza, uma anedonia. A filosofia composta
pela banda segue este conceito ou elaboraram um estudo aprofundado para
um melhor conceito?
Renato Gimenez: O conceito veio se
formando assim como as músicas foram surgindo, como chaves para um
mistério maior. Compondo as músicas do Vazio, os temas se entrelaçam,
entre o caminho da filosofia e sua relação entre a escuridão da alma e o
irracional. Com temas que também passam pelo luciferianismo, xamanismo
ancestral, assim a cabala draconiana e as manifestações de entidades do
culto aos mortos, esses são temas que fazem parte da cosmovisão que o
Vazio propõe, e nesse vórtex não cabem os dogmas do cristianismo
alienador e punitivo, e tampouco tenho vontade de falar sobre isso nas
letras, acho que algumas coisas já foram feitas à exaustão dentro do
estilo e funcionaram em suas devidas épocas mas nossa busca é pelo
renascimento das ideias, das artes negras e do pensamento combativo
underground. Fazer mais do mesmo não está nos nossos planos, tanto nas
letras quanto na música tentamos dar um passo além, respeitando nossas
limitações e com respeito ainda maior aos que fizeram a chama queimar
antes de nós.
Pedro Hewitt - Conhecendo os projetos paralelos de vocês, ênfase ao Social Chaos, Armagedom, Nuclëar Fröst, existe uma conexão que faz uma linha entre o Crust e Black Metal casarem super bem. Foi citado que irá vir a ser lançado um split com uma das bandas mais barulhentas do cenário de Queretaro (México), o Skid Raid. Seria uma coincidência ter uma união de duas bandas que possuem sonoridade parecida e com pensamentos que giram sob o mesmo espaço?
Renato Gimenez: Conhecemos os mexicanos do Skid Raid quando tocamos junto em 2017 em Gent na Bélgica, e foi muito massa conhece-los, as idéias bateram na hora e combinamos esse Split. Será um CD lançado no México, mas também com versão brasileira. Sou muito amigo do Antimo (guitarra do Skid Raid e do Hacavitz), não vejo a hora desse material sair. O material todo foi composto durante a pandemia de março à dezembro de 2020, gravamos tudo separado, sem muita interação física, então foi um desafio maior compor, gravar e gerar o material nessa situação de distanciamento e colapso. Mas estou ciente que temos boas músicas para mostrar pro nosso público e pra galera do México também. Assim como num futuro próximo, fazer uma tour por lá e trazer o Skid Raid pra tocar nas terras brasileiras também, os cara são gente boa, são pessoas ativas no underground já a muito tempo e a banda é sensacional. Lembrei que tem um dos caras do Skid Raid que tem uma outra banda foda também que chama “In Obscurity Revealed”, confiram.
Pedro
Hewitt - César Sánchez é um monstro dos projetos, creio eu que ele
tenha tocado com Escarnium (Bahia) algumas vezes, uma pena o Hacavitz
não poder vir ao Brasil por conta do vírus. Sob a parceria que está
vindo por aí, como percebem a inserção de mais um disco no cenário
nacional? Aliás, como vocês olham o mercado musical para as bandas que
estão crescendo aos poucos?
Renato Gimenez: Tanto o
Escarnium quanto o Hacavitz são bandas que gosto, possuem um forte
trabalho. Vejo nesse lançamento do Vazio com o Skid Raid do México mais
uma união underground que se solidifica, gerando esse disco split. Esse
trabalho foi composto de um jeito atípico para gente e sua sonoridade
reflete um pouco isso, cada um no seu espaço, nas suas casas,
trabalhando para conclusão de um material em comum. Acredito que carrega
um grande impacto emocional essas faixas que fizemos para esse
trabalho. As composições seguem na linha extrema mas de um outro jeito
que não havia tido tanto contato antes, acredito que adicionamos mais
melodia de tristeza, pesar e invocação de forças mortuárias, e foi por
causa da vibração de lamentação que se gerou nesse período de pandemia e
toda desgraça que enfrentamos nesses últimos tempos...
Pedro
Hewitt - Muitos confundem as variantes ideias existentes num gênero tão
variado que é o Black Metal, estes mesmos quando possuem um certo
contato com músicas desse gênero, costumam logo de cara idolatrar ao
satanismo como um todo. É fato que o Vazio se encaixa em uma determinada
oposição ao conhecimento do mensurável, às severas leis de excesso
severo, enfim, desde o primeiro EP vocês representam uma linha de
pensamento na qual motiva a se opor contra qualquer dogma do
cristianismo ou religião existente. O que podem comentar a respeito?
Renato
Gimenez: Uma renovação das energias nos trouxe às artes negras, um
chamado. E assim respeito muito o caminho que nos foi dado. Carregamos
conosco uma egrégora de fogo onde não cabem alguns valores que antes
eram ostentados. Nas letras trago a espiritualidade ancestral e também o
ódio dos mortos que abençoaram nosso caminho. Satanás é o arquétipo da
revolta por ser ele mesmo a iluminação da sabedoria, isso se reflete no
nosso meio onde muitos se identificam com o símbolo, mas nem sempre com
sua real vibração energética. Por isso apenas alguns são escolhidos para
caminhar nos infernos sem se queimar.
Pedro
Hewitt - Levando em conta a pergunta anterior, dois anos não foram dois
meses, é um processo árduo que existe em uma obra prima, que faz com
''Eterno Aeon Obscuro'' foi, continua sendo e será mais ainda um grande
lançamento para o cenário extremo. 2020 pelo Brasil foi um susto para
todos, a pandemia não estava aos nossos olhos, mas sob nossos lares,
pelo ar, pelas ruas, porém mesmo assim vocês lançaram o material. Porque
a decisão, já que estavam com tudo pronto, ou porque não deixaram pra
2021 (mesmo sabendo que haverá um novo disco)?
Renato
Gimenez: Obrigado Pedro, o disco teve uma boa repercussão mesmo sendo
lançado em março de 2020, bem na primeira onda da pandemia. Temos
composto bastante material e sabia que não poderíamos segurar esse
lançamento, foram dois anos produzindo o disco , então foi essa
estratégia, lançamos um clipe ao vivo, pra faixa “Elementais da Matéria
Escura”, fizemos um lyric vídeo pra “Nascido do Fogo” e um clipe oficial
para a faixa título “Eterno Aeon Obscuro”. Saíram mil cópias no Brasil e
mais 500 em Portugal em CD. Também saiu uma versão em vinil azul com
tiragem esgotada de 350 copias. No momento estamos compondo o sucessor
desse trabalho.
Pedro Hewitt -
Com a pandemia existente, a área cultural ficou extremamente
prejudicada, já é difícil para nós do Underground, imagina agora.
Paralisação, pausa de ensaio, restrições e lives está desde o início
tentando contornar o momento. Como lidaram e lidam com isso?
Renato
Gimenez: Inclusive, será que este ano ainda poderemos ver o Vazio em
algum palco presencialmente? Ainda é cedo dizer se vai ter show esse
ano, mas acho que não, mesmo com o avanço da vacina. Como você disse, o
setor cultural teve um grande atraso. Creio que vamos demorar muitos
anos pra conseguir voltar a ter o ritmo que tivemos, isso se tratando de
número e qualidade de casas de shows e etc. Pagamos muito caro toda
essa merda que aconteceu com o Brasil.
Pedro
Hewitt - As letras não são algo para ser estética, é realista,
sinistra, legítima e verdadeira. Qual a importância do português hoje em
dia no Underground?
Renato Gimenez: Cantar em português
traz muito mais propriedade e força nas palavras, para mim sinceramente é
natural. Sempre tive bandas com letras em português, oque muda é a
abordagem.
Pedro Hewitt - O
cenário nacional se renovou e se renova a cada dia, então qual o é o
público de vocês? Com essa situação política que corre pelo país, o
posicionamento pessoal e de banda faz com que haja divisores de águas.
Levando isso em conta, o que difere o público do final da década de uns
anos pra cá?
Renato Gimenez: Tudo mudou né, a cena não é
diferente, o entendimento de alguns em aceitar as mudanças nas
linguagens das artes é bem pessoal. Tem gente que ainda nos dias de hoje
acha que misturar metal com política é errado, isso em 2021. Mesmo todo
mundo morando nesse país fudido tem gente que concorda com governo
militar e essas merdas. Bom, tem louco pra tudo. A cena underground
sempre surpreende, pro bem e pro mal, mas nossa postura sempre vai
existir, somos contra o sistema de exploração capitalista em suas mais
variadas formas.
Pedro Hewitt - O cenário obscuro atualmente pelo Brasil possui a devida estrutura voltada para o Black Metal como deveria ser?
Renato
Gimenez: Nunca houve estrutura decente né, e não vai ser agora que vai
ter. Ainda é tudo bem precário, especialmente a maneira como a própria
cena age. Oque existem são alguns guerreiros e guerreiras que possuem
uma visão com iniciativa, e as vezes se juntam com alguns espaços que
abrem suas agendas para eventos do metal satânico. E em termos de
estrutura de som das casas de shows, é um desafio, a gente quase sempre
leva nossos equipamentos para garantir nossa sonoridade e para respeitar
o público que paga ingresso e merece ver uma apresentação decente.
Mesmo em São Paulo que é uma grande cidade, hoje em dia são poucas casas
com estrutura, maioria fechou na pandemia.
Pedro
Hewitt - Vejo muitas pessoas deste meio usando desculpas que gêneros
como o de vocês afastam regras sociais, causando atrito e criando fake
news para fazer com que a música extrema não seja símbolo de
resistência. O que acham?
Renato Gimenez: Acredito que não
haja cartilha e que cada banda e cada artista traça seu caminho mediante
as opções e escolhas que teu destino lhe dá. No passado o Black Metal
foi conhecido pelas polêmicas e blasfêmias, esse espírito vive dentro
das nossas críticas ao cristianismo e toda sua hipocrisia moralista. Mas
não somos uma banda de copia comportamento ou pensamento dos outros,
somos uma obra viva autoral, olhando para dentro das nossas vontades, a
voz dos mortos prevalece e esse tem sido o caminho do Vazio. Mais do que
qualquer outra coisa, somos uma banda que preza pela música.
Pedro
Hewitt - Creio que sempre haverá a chatice da briga "Cenário Nacional X
Cenário Internacional", onde parece ser que o Brasil nunca ficará
satisfeito com a bandas que existem. Apesar das reações variantes, o
Death Metal se reformula e se atualizada, as vezes se recusa a perder
sua relevância e naturalidade. Na visão do Vazio (Que não se perdeu);
qual a visão da razão disso? Vivemos num país de bandas de extrema
qualidade, isso é fato, escolha para a audição não deve faltar.
Renato
Gimenez: Brasil é um país muito grande, muito pobre e fudido devido aos
políticos e religiosos. Isso é a receita para termos uma cena musical
muito produtiva, cheia de revolta e criatividade. Um fervo de ódio.
Temos todo tipo de metal rolando, somos uma cena muito efervescente com
muitas bandas de alto nível. Desde meus 15 anos eu toco guitarra no
underground, já vi muita gente desistir de tocar música, eu etendo, sem
incentivo é foda seguir, tem que ter muita certeza de que o que você
está fazendo é relevante mesmo.
Pedro
Hewitt - Ainda em relação ao já citado. O que você acham dessa galera
que faz sucesso muito rápido hoje em dia. E desses movimentos em prol do
Metal, como coletivos, etc?
Renato Gimenez: Acredito que
sucesso é se manter íntegro na cena em tempos de tempestade e também nas
glórias. Nem todo mundo que chega junto, veio para ficar. Já sobre a
outra pergunta, creio que todo tipo de coletivo, associação e grupos que
realizam ações práticas em prol da cena são legítimos. Ação direta
transforma.
Pedro Hewitt -
Sem muita enrolação; quais os tipos de bandas na atualidade que merecem
ser entendidas como Underground e aquelas que, na opinião e referência
de vocês, não merecem ser?
Renato Gimenez: Para mim o underground é uma atitude e não um estágio para se chegar em algum lugar.
Pedro
Hewitt - Quando um ser que enfrenta uma crise por se sentir
espiritualmente vazia consegue largar um ação compulsiva, geralmente
apenas o troca por outro comportamento viciante, é um existência
tentadora. Aqui podemos encerrar esta entrevista e ficamos gratos por
elaborar conceitos e produzir registros que são incríveis. Saúde e vida
longa ao Vazio. O espaço é todo de vocês!
Renato Gimenez: Obrigado pelo espaço Pedro e todos leitores, nos encontraremos em breve!
Para mais informações, shows e merchandise: https://www.facebook.com/VAZIOBLACKMETAL/?ref=page_internal
Fotos por: Divulgação. Official Fanpage. Leandro Cherutti.
Fonte: Detector de Metal
0 comentários :
Postar um comentário