Por Pedro Cientista - 12/12/2002 - 23:15
Fullrock - A quanto tempo a banda existe? Como foi o início? Os integrantes da banda já se conheciam?
Lucas V. - A banda existe a cerca de três anos. No início éramos eu, Acélio e Delano, basicamente. O Delano e eu já nos conhecíamos há anos, estudamos juntos praticamente a vida toda. Conheci o Acélio através da internet, nos identificamos por ter gostos musicais e literários semelhantes, o que contribuiu para que surgisse uma amizade forte e verdadeira, que permanece até hoje. Alías, é bom frisar que o Morbydia, mais que uma banda de Doom Metal, é também um grupo de amigos (no mais pleno sentido da palavra). Várias pessoas passaram pela banda, de lá até aqui, e demorou um certo tempo para que nos estabilizássemos como estamos hoje.
[caption id="attachment_412" align="alignnone" width="550" caption="Full Rock 2002: Pedro Jansen entrevista Lucas Villa, do Morbydia"]
Fullrock - Qual a formação atual da banda? Já houve alguma alteração na formação da banda?
Lucas V. - A formação do Morbydia, atualmente, é: Lucas V. (Vocal/Guitarra), Acélio J. (Guitarra), Mateus B. (Baixo), Mariel T. (Vocal), Fernando B. (Teclado), Diego A. (Bateria). Várias mudanças ocorreram na formação desde o início até hoje e alguns dos ex-integrantes foram de suma importância para o desenvolvimento do Morbydia, como, por exemplo, Petillo J. (Into Morphin) e Giordano B., que, inclusive, gravou os teclados em nosso CD demo, Personae. Impossível não mencionar, também, Delano V., nosso primeiro baixista e um dos fundadores da banda, que teve de deixar o Brasil para estudar no Japão, mas que continua acompanhando o trabalho da banda de lá e quando vêm aqui sempre faz aparições em nossos shows.
Fullrock - Como é o processo de composição de material próprio?
Lucas V. - Nossas composições partem, inicialmente, das guitarras. Geralmente o Acélio começa a desenvolver o esqueleto das músicas (ele é a peça chave no nosso processo de composição. Acreditem, ele é bom nisso). Depois levamos a música a estúdio e começamos a ensaiar, cada um colocando suas contribuições para a melodia e ajudando a criar os arranjos para os demais instrumentos. Só depois de o instrumental totalmente feito e de percebida a atmosfera da música é que começo a pensar nos encaixes para os vocais e escrevo as letras, que geralmente refletem a coloração poética um tanto byroniana e ultra-romântica da banda, variando, principalmente, entre os dois vértices do romantismo gótico, o amor e a morte, e temperadas com a mesma melancolia e lirismo latentes nas harmonias, normalmente com um approach soturno e trágico. O uso de simbologias e de elementos da cultura grego-romana e vampírica tem, também, marcado presença nas letras do Morbydia.
Fullrock - Quais as influências da banda?
Lucas V. - A principal influência do Morbydia é, indiscutivelmente, o My Dying Bride, banda inglesa de Doom Metal da qual já tocamos algumas músicas em vários de nossos shows (como Your Shameful Heaven, Cry of Mankind e A Kiss to Remember). Nos influenciam, também, outras bandas do estilo, como Anathema, Paradise Lost, Tristania, Dark Tranquillity, Moonspell, bem como música clássica em geral (nosso tecladista tem formação de músico erudito, pianista clássico) e algumas bandas mais antigas, como Pink Floyd, Black Sabbath e Iron Maiden. Cada membro da banda tem suas influências pessoais, que podem, inclusive, ser conferidas no site da banda, www.morbydia.da.ru, que traz, também, outras informações sobre o Morbydia, além de arquivos de áudio, fotos e etc. Nas letras, as influências são de poetas ultra-românticos como Lord Byron, Keats, Goethe, Álvares de Azevedo, bem como do decadentismo francês (principalmente com Baudelaire), das tragédias gregas de Sófocles, Eurípedes e Ésquilo, além de filósofos considerados trágicos, como Nietzsche, Schopenhauer e Kierkegaard.
Fullrock - Como aconteceu a gravação do cd-demo? Como foi conseguida a verba para a gravação do cd?
Lucas V. - O CD Demo é, podemos dizer, um projeto temático, que mescla a melancolia e o romantismo gótico naturais da banda com elementos da cultura grego-romana. O título, Personae, significa, em latim, "máscaras", e é como os antigos romanos chamavam as máscaras utilizadas pelos atores gregos no Teatro de Dionísio. As letras contam com dois eus líricos, que interagem entre si, como personagens em uma cena de ato teatral.
A gravação do CD era inevitável, uma vez que a quantidade e qualidade das composições, no entender da banda, já eram um tanto elevadas e urgia que se desse publicidade a este trabalho. A banda escolheu três músicas, sendo elas "A Face to the Marbled Stone" (disponível para download em nosso site), "Words of Dionisy" e "The Teardrop Prelude", e entramos em estúdio. O CD foi gravado no Altec Studio, com a coordenação do Mike (Megahertz), que foi de fundamental importância para que tudo corresse bem. Só temos a elogiar tanto o trabalho dos profissionais do estúdio como a qualidade dos equipamentos do mesmo, a gravação saiu extremamente satisfatória. Quanto à verba para a gravação do CD, cada membro deu seu jeito de conseguir sua parte, como pôde, para arcar com as despesas da gravação (que não foram poucas), já que a banda não possuía nenhum tipo de patrocínio ou incentivo material. Eu, por exemplo, tive que dar aulas particulares de matemática pra conseguir a minha parte de forma mais folgada. É uma pena que o metal, no Brasil, tenha tão pouco incentivo, o que dificulta terrivelmente o trabalho das bandas.
[caption id="attachment_413" align="alignnone" width="550" caption="Discografia: Demo Personae e Requiem to the Sun, lançado em 2005"]
Fullrock - O que vocês acham da cena do Piauí?
Lucas V. - O que podemos ver no cenário musical piauiense é uma infinidade de bons músicos, com grande capacidade, mas que, muitas vezes, se resumem a imitar bandas européias ou americanas, ou montando bandas cover (que, na maioria das vezes, não têm nada novo para acrescentar à cena), ou montando bandas com composições sem personalidade, sentimento e profundidade. Claro que há, também, ótimas bandas, músicos criativos, e exemplos disso são a Anno Zero, Into Morphin, Dark Season, para citar algumas poucas, entre várias outras que existem e surgem a cada dia no estado. É uma pena que o espaço seja restrito e que muitas bandas que poderiam estar mostrando trabalhos interessantes nos eventos da cidade sejam obrigadas a ficar confinadas em garagens e estúdios, impossibilitando o público de tomar ciência de suas existências. Mas a mensagem que deixamos para o cenário é esta: criatividade e personalidade, acima de tudo.
Fullrock - Vocês fazem um som que é classificado como "doom metal". Quais as principais características desse estilo?
Lucas V. - O Doom Metal é um estilo para ser amado ou odiado. Aqui não há que se falar em meio termo. É um estilo cheio de peso, mas, ao contrário de outros ramos do metal, não é feito só disso. O sentimento é elemento crucial dentro do doom metal, é um estilo pesado, porém lento e melódico na maior parte do tempo (o que faz com que alguns pouco entendidos no assunto ou com sérios problemas de sensibilidade musical o achem "chato" ou "cansativo"). São músicas melancólicas, com melodias e letras tristes, que transpiram apelo lírico. Alguns reclamam que nossos shows são um tanto "parados", que nossas músicas deveriam ser mais "agitadas", para que o público pudesse "bater cabeça". Bom, o que tenho a dizer é que, felizmente, o doom metal é música para a mente e para a alma, e não para o corpo. Nossa intenção, ainda que às vezes façamos algumas músicas mais rápidas, é continuar fazendo o som que nos arrepia, que nos enche de satisfação e nos faz sentir nossa música como reflexo de nossas almas. Continuaremos fiéis ao doom e sua melancolia, ainda que isto desagrade a alguns que clamam por músicas agitadas. A estes, sugiro que vão a uma boate ou a um show de forró e coloquem pra fora todas as energias acumuladas em seus corpos.
Fullrock - O que vocês acharam do TRIBUS III?
Lucas V. - Na verdade o Tribus funciona como uma espécie de vitrine. Várias bandas, de vários estilos, ficam lá, expostas ao público, e assim se pode conhecer o trabalho delas, se identificar, com uma ou com outra. É uma oportunidade interessante, tanto para as bandas, que podem divulgar seus trabalhos, como para o público, que pode conhecer coisas novas ou apreciar coisas antigas, que já conhece. O evento tem criado uma certa polêmica pelo fato de ter trazido bandas de fora, ter dado grande destaque às bandas cover. É claro que o ideal seria que se estimulasse somente o trabalho de bandas que criassem algo novo, que tivessem trabalho próprio, ao invés de apenas parasitar a criatividade alheia, mas não acho que o erro parta da organização, culpar os organizadores é uma espécie de inversão da relação causa-consequência. A questão parte, sim, do público. Um evento grande, como é o caso do Tribus, implica na necessidade de um público grande, e o grande público é, ainda, infelizmente, um tanto alienado, por assim dizer. Não é a organização que prefere as bandas cover, e sim o público que as prefere, e por isso, a organização tem a necessidade de pô-las para tocar. Falta, no público, esse aspecto da criticidade, da valorização da criatividade em detrimento do plágio. E essa ignorância da massa não data de hoje, remonta aos mais remotos séculos. É como diria Kierkegaard, "o povo é a inverdade".
Sobre o nosso show, especificamente, foi bom, apesar de alguns contratempos. Tocamos em um horário que não era o nosso e não tivemos a oportunidade de passar o som, graças a alguns problemas com um dos palcos que teve de mudar os planos da organização. Ainda assim o resultado foi interessante, apesar de que a banda ainda acredite não ter atingido o seu ponto ideal sobre os palcos, como já atingiu em termos de composição. Mas estamos trabalhando nisso e creio que a tendência de nossos shows é estarem cada vez melhores.
Fullrock - Quais os projetos futuros da banda?
Lucas V. - Os projetos são continuar compondo e realizar, o mais breve possível, um show de lançamento de nosso CD demo. Faz parte dos projetos também uma nova leitura da nossa presença sobre os palcos e da dinâmica de nossos shows. Pretendemos também, em breve, enviar alguns exemplares de nosso cd demo para revistas, zines e etc, afim de colher críticas. Com o dinheiro que estamos arrecadando com as vendas da demo pretendemos entrar novamente em estúdio e gravar novo material, o quanto antes. Estamos também vendo a possibilidade do lançamento de nosso primeiro CD por um selo que se interessou por nosso trabalho, mas que preferimos não divulgar o nome, dada a incerteza da negociação, que ainda se encontra em seus princípios. No demais é isso, como diz o Ed Zee, do Anno Zero, "doom or be doomed"!
Couldnt agree more with that, very attractive article
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